Page 82 - Revista EAA - Edição 61
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PONTO DE VISTA
Engenheiros
entusiastas
Estamos vivendo em uma era em que as mudanças tecnológicas, além de alterarem o
comportamento da sociedade, também nos levam a novas interpretações de velhos dita-
dos e frases. Quem, do setor automobilístico, não conhece a frase do mestre Enzo Fer-
rari? “Eu escolhi o automóvel como um símbolo de liberdade extrema para o homem.”
Concordo. Atravessamos o século 20 vendo o automóvel ir muito além de sua fun-
ção básica de meio de transporte, nós o vimos se transformar em um símbolo de liber-
dade, dando ao homem o livre-arbítrio para escolher seu próprio caminho, como ir,
por onde ir, quando e com quem ir. O automóvel se transformou em um instrumento
para a realização de muitos de nossos desejos, permitindo-nos explorar novos caminhos,
visualizar novas paisagens, ter contato com novas culturas e, por que não, massagear
nosso ego.
É claro que sempre haverá os que veem o automóvel como o grande problema das
nossas cidades, poluidores, responsáveis por grandes congestionamentos e pelo desper-
dício de tempo, um dos nossos bens mais valiosos. Mas não pretendo discutir esse ponto
LÁZARO JP AZÊDO é Engenheiro de aqui, simplesmente porque o foco é outro.
Produto na MAN Latin America, Voltando à evolução tecnológica e seu desdobramento no modo como nos relacio-
bicampeão do Rally dos Sertões e
namos com os automóveis, acompanhamos, colaboramos, e por que não dizer, trabalha-
Chairman do Painel Motorsport do
mos muito, para que essas máquinas se tornassem mais rápidas, mais econômicas, mais
Congresso SAE BRASIL
confortáveis e seguras, tornando-as uma extensão de nossa personalidade e do modo
como vemos e queremos ser vistos pelo mundo.
Vivemos em uma época de grandes mudanças sociais, estamos cada vez mais conec-
tados e dependentes dessas novas conexões, que até pouco tempo eram vistas somente
em filmes de ficção científica.
Conectados? Aposto que nessa nem Enzo Ferrari pensou! A sociedade evoluiu, e
com ela o modo como o automóvel é visto. Basta uma olhada nos anúncios dos mais
recentes lançamentos da indústria e vemos que conceitos de desempenho, estabilidade,
potência, torque e consumo são pouco, quando são, explorados. Hoje se vende um carro
baseado em sua conectividade; palavras como Bluetooth, USB, GPS, comando de voz,
CABE A NÓS A CRIAÇÃO e-mail, rede social, touch screen etc. são itens obrigatórios na lista de qualquer compacto
DE PRODUTOS QUE que pretenda ocupar um mínimo lugar no mercado.
REACENDAM NAS NOVAS O automóvel vem, gradativamente, perdendo seu espaço como objeto de desejo das
GERAÇÕES O DESEJO EM novas gerações diante de uma realidade onde a presença física deixa de ser primordial
APRECIAR A MÁQUINA nas relações e contatos sociais, onde o conceito de liberdade está mais ligado à comuni-
cação, longe do imaginado por Ferrari.
E qual é o papel dos Engenheiros Automotivos nisso tudo? A meu ver, cabe a nós,
engenheiros entusiastas, a manutenção do encanto perdido, a criação de produtos que
reacendam nas novas gerações o desejo em apreciar a máquina, em sentir as leis da física
atuando sobre nossos corpos, em projetar veículos que não encantem apenas pelo de-
sign, mas que nos devolvam o prazer da relação com a máquina. Parece muito poético?
Em um mundo globalizado, direcionado por reduções de custo e homogeneização da
tecnologia, pode ser. Mas basta uma olhada nos novos Jaguar F-Type ou Audi A4 TDI
para percebermos que há outros caminhos a serem percorridos.
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